Esse texto faz parte de uma série que revela a história não contada sobre como criei a maior plataforma de print on demand da América Latina sem saber nada do mercado, ter família rica ou levantado milhões de reais. Também é a história da minha vida e de como construí a Touts.
Fui influenciado pelo Eduardo Belotti e estou escrevendo essa história em partes, postando um capítulo por semana dessa aventura. Esse é o capítulo 10 de 19 - encontre os demais capítulos aqui.

A essa altura estávamos decididos a fazer a expansão offline da Touts para replicar o sucesso da Kombi.
Estávamos muito felizes com o time que tínhamos montado com Flavinho tocando tech, Lacerda entrando para tocar a frente offline, Arturo e eu jogando nas 11.
Por isso a bomba de que o Flavio iria morar fora nos abalou.
Ele estava indo para Boston morar junto com a namorada que tinha passado para Harvard.
É o tipo de coisa que não acontece todo dia e nós já sabíamos que o Flavinho queria sair do Brasil.
O que nos surpreendeu foi que ele topou continuar trabalhando remoto de lá. Isso foi em 2016 e trabalho remoto não era nem um pouco popular, por isso estávamos apreensivos.
Mas a sinergia do time era tão boa que topamos e decidimos que faríamos funcionar.
Aqui os aprendizados do Basecamp sobre como operar nesse formato foram muito valiosos mais uma vez.
Tivemos que aprender a trabalhar remoto antes de muita gente por pura necessidade.

Flavinho dando algum rollback direto do Lincoln Memorial
Para mim, particularmente, foi ótimo, pois estava dividindo meu tempo entre escritório, faculdade e casa, então aproveitei para começar a trabalhar de outros lugares.
Resolvida a questão do CTO, caímos dentro do desafio de fazer nossa primeira loja física definitiva.
Ao conversar com os shoppings, entendemos que uma loja seria extremamente cara. Além dos aluguéis caríssimos, teríamos que pagar pela luva e uma reforma. Sem chances.
Chegamos a cogitar lojas de rua, mas os pontos também não eram baratos, fora que teríamos que lidar com novos problemas como segurança e manutenção. Também era inviável.
Apesar da Touts estar crescendo, o único dinheiro que tínhamos para reinvestir era o caixa que o próprio negócio gerava, e não sobrava muita coisa.
Nosso sonho sempre foi fazer uma loja conceito, onde tivéssemos várias máquinas expostas para as pessoas verem os processos produtivos de perto.
Um lugar que fosse também um coworking para os artistas da plataforma, com espaço para workshops e palestras.
Claro que também teria um bar e área de convivência para quem quisesse só trocar uma ideia e conhecer pessoas incríveis.
Bom, esse era o sonho. A realidade nos mostrou outro caminho.
Para replicar a experiência da Kombi não precisávamos de muito espaço, por isso a próxima melhor coisa depois de uma loja e que caberia no nosso orçamento era um quiosque.
A ideia de um quiosque no shopping estava longe de ser nossa loja dos sonhos… Mas, mais uma vez e como tudo que fizemos, decidimos abraçar as restrições e usar nossa criatividade para transformar o quiosque na loja mais incrível possível!
Assim, começamos a saga da operação física da Touts.
Como não sabíamos nada sobre varejo, começamos a estudar o máximo que podíamos e conversar com todo mundo que sabia mais que a gente sobre o assunto.
Demos sorte de, alguns anos antes, os fundadores da Zee Dog estarem montando um estande ao lado do nosso em um evento e termos feito amizade. Rolou uma conexão por sermos os únicos empreendedores montando os próprios estandes e não as equipes de montagem das empresas.
Como eles tinham aberto algumas lojas e quiosques mais ou menos na mesma época que nós, pedimos ajuda e aprendemos muito com a Zee.
Logo de cara ficou claro que o primeiro desafio seria encontrar um ponto. Um mix de arte e ciência, levando em conta seu posicionamento, o público do shopping, um estudo de fluxos de pessoas e uma pitada de sorte.
O Arturo chegou a comprar aqueles contadores de fluxo pra ficar parado em corredores de shoppings analisando quantidade de pessoas que passavam.
Era uma questão da taxa de conversão: qual a quantidade de potenciais clientes passantes que poderíamos converter.
Depois de analisar as propostas dos maiores shoppings do Rio, entendemos que o Barra Shopping seria o melhor lugar para começarmos.
E por obra do destino, havia vagado um ponto bem em frente ao quiosque da Zee Dog que poderíamos ocupar.

Ponto no Barra Shopping
Falando assim parece que foi simples, mas para entrar em um shopping não basta escolher o ponto e pagar, você precisa ser aprovado pelo comitê.
Quanto mais badalado o shopping, mais exigente é o comitê. E o Barra Shopping é um dos maiores da América Latina, além extremamente movimentado e disputado.
Ou seja, como não conhecíamos ninguém, nos restava impressionar o comitê.
Nossa ideia do quiosque era bem diferente, a pessoa poderia escolher na hora de um catálogo com artistas do mundo todo, ver seu produto sendo feito na hora com uma qualidade fora de série e ainda conhecer a história dessas pessoas incríveis.
O problema era que não tínhamos um projeto de arquitetura para apresentar, só o conceito. E isso não era o suficiente.
Chegamos a conversar com alguns estúdios de arquitetura, alguns especializados em lojas e quiosques e outros mais iniciantes. Todos tinham uma coisa em comum: queriam nos cobrar muito mais do que poderíamos pagar.
O Arturo estava tão frustrado que considerou desenhar por conta própria o projeto. Convencemos ele de que fazia sentido buscar alguém que entendesse pelo menos um pouco do assunto.
Quem acabou salvando nossas vidas de ter um quiosque desenhado pelo Arturo foi o Thiago Holzmeister, designer de produto fenomenal e sócio do meu irmão na Green Ant.
O Thiago tinha trabalhado por muitos anos na Tátil e já até ganhou prêmios por seus projetos de design de produto. Ele nunca tinha feito um quiosque e era especialista em produtos físicos, mas topou nos ajudar.
No fim, ele fez o projeto todo, com detalhamento técnico e tudo, seguindo o conceito que imaginamos por uma fração do custo que os estúdios queriam nos cobrar.
Usamos esse projeto por anos e anos e somos eternamente gratos ao Thiago por topar trabalhar aos fins de semana e nos dar essa moral.

Projeto do primeiro quiosque da Touts
Com o conceito e projeto bacanas, foi questão de tempo até o shopping nos aprovar. E conseguimos o ponto que queríamos, perto da Zee Dog e da passarela do segundo andar que conectava dois shoppings.
A essa altura, já sabíamos que seria caro, mas não imaginávamos que fosse tão caro assim. O quiosque tinha 9m quadrados e custava impressionantes R$16.000,00 por mês! E fica pior, em Novembro o shopping cobrava 1,5 vezes o aluguel e o dobro em Dezembro.
Quando finalmente dependia de nós aceitar ou não a proposta, precisamos dar alguns passos atrás, refazer as contas e conversar sobre tomar essa decisão ou não.
A conversa que tive com Arturo e Flavio sobre abrir ou não o primeiro quiosque foi inesquecível.
Fizemos as contas e percebemos que, pagando pela obra do quiosque, contratando os vendedores, estoque, aluguel e tudo mais, teríamos caixa para rodar o quiosque por um mês. Se desse errado e as contas não fechassem, só teríamos dinheiro para encerrar as operações e não sobraria mais nada.
“Se for pra quebrar, melhor quebrar logo” foi a nossa conclusão.
Desde o início, nenhum de nós tinha topado estar ali para fazer um negócio pequeno e a nossa lógica era de que se fosse um risco que valesse a pena, mas deu errado, estava tudo bem.
Precisávamos tentar e fazer de tudo para o negócio crescer na velocidade que a gente acreditava. E foi o que fizemos.
Demos nosso salto de fé no abismo do desconhecido com a cara e com a coragem.
Assinamos com o Barra Shopping e começou a contagem regressiva para inaugurarmos nossa loja.
Quem construiu o quiosque foi o Alberto, um marceneiro lá da Vila da Penha e amigo da mãe do Arturo — sempre ela —, que era pai da Mariana que trabalhou conosco na fábrica.
O Alberto nunca tinha feito um quiosque propriamente dito, mas já tinha feito alguns estandes e muitos armários.
Convencemos ele de que era basicamente “um armário gigante” e ficamos indo a sua oficina de tempos em tempos para acompanhar a produção.

Uma das partes do quiosque ainda na oficina do Alberto
Conforme ia chegando perto da data do lançamento, o frio na barriga só aumentava. Até que não tinha mais volta e o que restava era fazer funcionar.
Em Outubro de 2016 abrimos nosso quiosque pela primeira vez, sem fazer ideia do que aconteceria.
Nas semanas anteriores Lacerda e Arturo contrataram o time de vendedores que não tinham nem como ser treinados. Parte por não termos a loja e parte por nem nós sabermos como seria o dia a dia.
Nossos primeiros vendedores foram heróis de embarcar nessa aventura com a gente: Caio, Hayla e Diegão. Além deles, Lacerda, Arturo e eu nós revezamos para completar a escala.
No dia da montagem, Arturo e eu fomos lá com a equipe do Alberto para ajudar.
As montagens e obras nos shoppings tem que acontecer de madrugada, enquanto o shopping está fechado, geralmente depois das 23h.
Foi engraçado que o supervisor do shopping não acreditou e ficou tirando fotos nossas carregando as placas de madeira pelos corredores do shopping de madrugada. Ele disse que foi a primeira vez que viu os próprios donos da loja fazendo a montagem.
Para nós não poderia ser de outra forma.

Carregando partes de quiosques por aí
Esse dia da inauguração foi uma loucura a parte. Nós viramos a noite para montar o quiosque, que só ficou pronto mesmo por volta de 9h da manhã. Estávamos morrendo de medo de ser multados por não conseguir abrir a loja a tempo. O medo da multa só não era maior que o medo das peças do quiosque não encaixarem!
Depois de muito suor, deu tudo certo.
Abrimos no primeiro dia e a empolgação foi tanta que ficamos lá do momento em que abrimos até fechar.
Só para percebemos no fim da noite seguinte que não tínhamos capa para cobrir o quiosque! Não dava pra fechar!

Montagem do Barra Shopping — repare que já está de manhã e longe de estar pronto
O resultado foi que ficamos lá mais uma madrugada fazendo os retoques, colando adesivos e fechando as contas do primeiro dia de vendas.
Lembro que fiquei quase 30h sem parar dentro do shopping. Um completo lunático, não recomendo essa experiência para ninguém.
A adrenalina era tão grande de ver o quiosque funcionando, as pessoas comprando e sendo bem atendidas que o cansaço só veio depois.
No fim, nossa aposta se pagou.
O quiosque foi um sucesso absoluto e naquele fim de ano descobrimos o poder do varejo e a magia do natal.
Vendemos muito e todas as contas fecharam!
Conseguimos replicar a experiência encantadora que criamos anos antes nos estandes e feiras, agora de uma forma que parecia bem mais escalável — ou pelo menos replicável.
Parecíamos ter descoberto a fórmula vencedora e um caminho para o sucesso.

Primeiro dia de vendas do quiosque
Estava tudo indo bem, até que percebemos que o quiosque talvez tivesse dado certo até demais…
Um novo concorrente, e antigo conhecido, havia acabado de anunciar que lançaria um modelo inovador de quiosque, com produção de camisetas sob demanda, e no Barra Shopping. Adivinha quem? A Reserva!
Mas você vai saber mais detalhes disso no próximo capítulo.